CARLOS ROSA MOREIRA
CARLOS ROSA MOREIRA
Membro do Cenáculo Fluminense de História e Letras, da Academia Niteroiense de Letras e da Associação Niteroiense de Escritores. Tem oito livros publicados, todos de crônicas e contos.

Por: CARLOS ROSA MOREIRA

18/02/2021

11:54:46

O VIZINHO

Hoje recebi um telefonema e soube que o meu vizinho do lado se matou.
O VIZINHO
Mas a causa não foi solidão. Tampouco se chamava Alfredo. Contudo parecia bom e, nesse aspecto, se assemelhava ao personagem da música de Vinícius. Foi o sujeito mais praiano que conheci. Se houvesse sol, fazia da areia sua sala de visitas. Tinha-lhe particular simpatia. Não só por ser boa pessoa, mas porque gostava do meu filho, que conheceu desde recém-nascido. Contaram-me que não foi gás, foi tiro no coração. Não quis conhecer o futuro que o destino lhe ofereceria em breve. Preferiu demitir-se dessa vida a ficar ligado a tubos, agulhas, cateteres. Encontraram-no como se dormisse, parecia tão bem que a empregada não ousou chamá-lo....

 ...Assim me contaram ao telefone.

            Penso em tudo isso sentado num banco de cimento, aqui na Praça Santa Teresa. Estou cá em cima nas montanhas, longe do meu mar e da praia do vizinho. É manhã de domingo. Há sol, o jornal diz que faz mais de quarenta graus lá embaixo, mas aqui o ar é agradável e fresco. As pessoas chegam para a missa. Um casal de velhos, tão velhos, também se dirige à igreja. Mas ela quis ver umas bugigangas na barraquinha de artesanato ali ao lado. Ele espera e reclama que ela demora.

            ─ Você é enjoado! Não me apresse; não sabe que eu gosto de ver essas coisas? ─ e seguem, resmungões, de braços dados, curvadinhos, vagarosos, velhíssimos. E tão jovens, estranhamente jovens. Amaram-se?

            É doce a paz desta manhã aqui na praça da matriz. A igreja de Santa Teresa me emociona. Não tem a riqueza, o requinte e a arte de suas exuberantes colegas europeias ou mesmo de sua “irmã” petropolitana, mas é honesta e digna em sua modéstia gótica, ou neogótica. Penso no vizinho, penso na morte e imagino que, se tiver um troço agora, não será tão mau. É um bom momento, meu coração está repleto de pequenas coisas pacíficas, irá leve e calmo. Na verdade, se pudesse escolher, preferiria morrer numa carga em combate, igual àqueles ingleses de Balaclava, indo ao encontro da velha iniludível aos berros e na porrada.

            Tocam os sinos da igreja, da simpática igreja de Santa Teresa. Desta vida há quem se aposente, há os demitidos e os que se demitem. Meu vizinho se demitiu. Espero que tenha olhado sua praia da janela naquele último instante, e tenha sorrido, sem arrependimentos.

            Sinto-me vivo e feliz. A sombra da árvore é boa, as pessoas têm fisionomias simpáticas, a brisa fresca espanta o calor e o sino espalha aos quatro ventos o ancestral convite da igreja. Em que pensa um homem em seu último momento? No futuro da jovem viúva? Na riqueza amealhada? Na melancólica e sempre tardia consciência de não ter tido consciência de que foi feliz? Na família, certamente. No que deixou de fazer? Nas maldades e bondades que fez? Num amor, decerto... Em Deus! Em doces manhãs como esta... Quem sabe? Sei que me dá uma vontade danada de tomar um chope no bar ali da esquina. Mas antes entro na igreja, faço uma oração para o vizinho amigo e me sinto em paz com a vida. Saio acreditando que a perfeição existe e é esta manhã de domingo. Esta fugaz e agradável manhã.


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